De olho nas expectativas

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Por Tatiana Pinheiro

Há algum tempo, desde o encerramento do ciclo de alta de juros em agosto passado, o jogo de paciência do Copom busca garantir que os canais de transmissão da política monetária reduzam a inflação e coordenem as expectativas. A decisão de juros desta semana reafirmou essa estratégia, dizendo que manter a Selic elevada por período prolongado tem se mostrado apropriado. Quebrar a dinâmica inflacionária e, assim, trazer as expectativas para baixo é o objetivo. Algumas cartas já estão em jogo: deflação no atacado e desaceleração da demanda doméstica, mas ainda falta a decisão sobre a meta de inflação pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em 29 de junho, e isso justifica a cautela da autoridade monetária. A meta é crucial no processo de desinflação, pois, ao resumir as intenções da política econômica, influencia a inflação corrente e a futura.

A boa notícia é que a possível manutenção da meta de inflação em 3% pelo CMN tende a ajudar, e muito, em trazer as expectativas de inflação para baixo. Estimo que o consenso para a inflação 12 meses à frente se reduza significativamente em breve – possivelmente se aproximando dos 3%.

Parte desta queda já está contratada. A deflação no atacado – tanto em matérias primas (-15% nos 12 meses encerrados em maio) como nos bens intermediários (-10%) – sugere um arrefecimento adicional nos preços dos bens ao consumidor. A apreciação recente do real contribui para manter estes preços distensionados. Com isso, a inflação medida no IPCA de bens tradables pode cair para 2%, dos 4,9% acumulados em 12 meses até maio. A inflação de serviços também pode cair para 5%, dos 6,5% vistos em maio. Neste caso, a queda seria fruto não apenas da maior sensibilidade deste segmento aos juros mais altos como do declínio dos preços de alguns insumos – como, por exemplo, petróleo. Isto deve permitir que a inflação corrente rode em 0,3% m/m em média no segundo semestre, ou seja, próxima de 3% a/a na margem.

Contudo, a maior parte da reancoragem da expectativa de 12 meses depende da definição da meta de longo prazo – e por isso a decisão do CMN pode influenciar, e muito, a trajetória das expectativas. Minha estimativa é que 70% da expectativa de 12 meses à frente seja definida por ela.

Dentro do arcabouço de meta, a ideia é que a meta de inflação oriente as expectativas de inflação de curto e de longo prazo. De fato, as expectativas de curto prazo subiram 0,3 ponto porcentual e as longo prazo, 1 ponto porcentual com o debate promovido pelo governo sobre uma possível elevação da meta – uma ilustração empírica desta relação.

A meta sinaliza o patamar de inflação que o governo aceita conviver para alcançar seus demais objetivos de política econômica, como crescimento e emprego. É importante diferenciar o curto do longo prazo, porque crescimento e emprego no longo prazo são definidos por outros fatores: capital, força de trabalho e produtividade. Se o governo desejar impulsionar o crescimento no longo prazo, é nestas variáveis que deve focar. Se nada for feito em relação a esses fatores produtivos, qualquer crescimento ou emprego acima do potencial virá ao custo de inflação muito mais alta e outros desequilíbrios (fiscal e de balanço de pagamentos, por exemplo).

Olhando para frente, acredito que os mercados estão corretos em esperar o início da queda de juros em algum momento dos próximos meses. A perspectiva é de moeda fortalecida, continuidade da deflação dos preços no atacado, deflação no IPCA de junho e inflação baixa até dezembro. Mas estes são efeitos de curto prazo. A mudança permanente da dinâmica inflacionária e das expectativas ainda está para ser definida na decisão do CMN no final do mês. Alterações que vão além do sistema de ano calendário e intervalo de flutuação da inflação resultarão em altas das expectativas, como observado de janeiro a maio, prolongando a alta dos juros – certamente contrariando todas as expectativas.

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